É a sofreguidão com que se devora o objecto desejado
que desmascara a devassa que nos distingue.
A força com que nos agarramos ao prazer,
a forma como lhe sugamos cada momento, cada detalhe.
Os olhos não mentem, os gestos ainda menos.
Revelamos o que somos e o que oferecemos,
pela forma como nos atiramos ao que cobiçamos.
Impetuosos, insaciáveis, vorazes, gulosos, pecaminosos, promíscuos,
todos incapazes de disfarçar o que nos move sempre que o desejo se intromete,
sempre que o prazer da carne nos surge pela frente.
Não há manual de boas práticas, códigos de conduta ou etiqueta aconselhável
para aqueles que não vivem sem prazer.
Os outros, esses outros, chegam com cautelas,
com prós e contras devidamente pesados,
com vantagens e desvantagens ponderadas.
Não engolem temendo indigestões,
não se entregam por completo, temendo desilusões.
Os outros, esses infelizes outros,
não dão tudo porque amanhã é outro dia,
não exageram, porque os outros, iguais aos outros,
poderão desaprovar, poderão proscrever.
Mas desenganem-se os outros, os contidos,
que quem descontroladamente se despe
sorri mais, sente mais, acerta mais.